2 de janeiro de 2013

O novo marco regulatório do setor portuário

Muito se esperou e finalmente tomamos conhecimento do novo marco regulatório do setor portuário. Dentre as alterações anunciadas pela presidente Dilma Rousseff, podemos destacar os significativos investimentos para a modernização portuária, que giram em torno de R$ 54 bilhões, e o papel fundamental conferido à Secretaria de Portos, órgão responsável pela centralização e planejamento do setor.

O tão esperado marco regulatório veio à luz com o Decreto nº 7.860, que cria a Comissão Nacional para Assuntos de Praticagem, e o Decreto nº 7.861, que institui a Comissão Nacional das Autoridades nos Portos (Conaportos), e, especialmente, com a edição da Medida Provisória (MP) nª º 595.

A Comissão Nacional para Assuntos de Praticagem tem a atribuição de propor o preço máximo para a prestação dos serviços, ao passo que a Conaportos recebe a competência para, em âmbito dos portos públicos e terminais de uso privado, integrar as atividades desempenhadas pela Receita Federal, Polícia Federal e a Anvisa, buscando maior coesão no desempenho de suas atribuições.

Com a nova MP, o porto organizado, chamado de porto público, é definido como o bem público construído para atender a necessidades de navegação, de movimentação de passageiros ou de armazenagem de mercadorias. Sua exploração pela iniciativa privada será realizada por concessão, no caso do particular assumir a integralidade do porto ou por arrendamentos portuários, no caso de instalações portuárias pontuais.

Com as novas regras da MP 595, o que o Poder Público confere ao particular é o direito de uso da área pública do porto e não a delegação da prestação do serviço público, como no regime anterior. A alteração, que aos olhos do observador comum parece simples, sob a perspectiva do direito produz importantes efeitos, como o afastamento do peculiar e especial regime jurídico incidente nos serviços públicos.

O Terminal de Uso Privado (TUP) passa a ser definido como a instalação portuária explorada pela iniciativa privada mediante autorização, cuja localização está fora do porto organizado. Desprezam-se as exigências contidas no regime anterior que obrigavam o particular a conter no terminal "movimentação preponderante de carga própria e, em caráter subsidiário e eventual, de terceiros".

Essas expressões, pelo elevado grau de abstração, traziam dificuldades de se aferir, com rigor, em que medida o particular promoveria a movimentação "preponderante" de carga própria ou a movimentação "em caráter subsidiário e eventual" de carga de terceiros. O novo marco regulatório, ao dispensar tais expressões, resolve a questão conferindo ao particular a liberdade de movimentar cargas próprias ou de terceiros na proporção que lhe bem aprouver.

 
A nova legislação traz importantes instrumentos para modernizar os portos
A nova legislação ainda determina que a autorização ao particular seja precedida de chamada e processo seletivo públicos, devendo sua formalização ser realizada por um contrato de adesão. Com a nova regulamentação, o Conselho da Autoridade Portuária, até então apontado como um grande gargalo para eficiência dos portos públicos, recebe uma nova cara, deixando de ser um órgão deliberativo, que homologava as tarifas e aprovava planos de zoneamento do porto, para converter-se em órgão consultivo da administração portuária.

A MP 595 também estabelece a obrigatoriedade de licitação para os 54 terminais públicos arrendados antes da Lei dos Portos de 1993. Nesse ponto, provavelmente haja tensão entre a decisão do governo e a iniciativa privada, já que os particulares que se encontram nessa situação alegam possuir direito adquirido à renovação.

A realização de licitação dos terminais atende ao princípio da isonomia, o que demonstra uma preocupação da MP em harmonizar-se com normas constitucionais do regime jurídico do direito público. Todavia, será imprescindível a instauração de um processo administrativo que garanta a fiel observância ao direito de defesa dos titulares dos arrendamentos vigentes.

O desenvolvimento da infraestrutura no Brasil depende da parceria entre o público e o privado, mas de forma transparente e garantida pelos referidos princípios, cujo objetivo será sempre a tutela do interesse público e o desenvolvimento nacional.

Por fim, a MP ainda prescreve que as licitações para concessão e arrendamento, bem como para as obras do Programa Nacional de Dragagem Portuária e Hidroviária II poderão ser conduzidas pelo Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), o que comprova a orientação do governo em estender o uso desse regime para seus projetos prioritários, devendo o Poder Público motivar a decisão pela adoção do RDC sempre que o utilizar.

Salvo problemas pontuais, pode-se afirmar tranquilamente que a nova legislação conferirá instrumentos importantes para a modernização dos portos brasileiros. Agora, o importante é fiscalizar e torcer para que esses instrumentos, de fato, saiam do papel.

 
Fonte: Jornal Valor Econômico

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